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HERÓIS EM QUESTÃO

No Panteão da Pátria e da Liberdade, localizado na Praça dos Três Poderes, em Brasília, se encontram os bustos de heróis nacionais arrolados pelo Congresso mediante critérios rígidos, desde que transcorridos 50 anos de sua morte.
São pouquíssimos, um esquálido retrato de quão pobre é o país que cata heróis, como siris em manguezais, para se reafirmar. Zumbi, do Quilombo dos Palmares, desafiando os escravocratas e preferindo lançar-se de um penhasco a ter que voltar para o cativeiro, merece a láurea máxima. Secundado por Tiradentes, o mártir da Inconfidência Mineira que desafiou a Corte. D. Pedro I, ao proclamar a Independência, esquecendo-se de que o mentor involuntário houvera sido Napoleão ao defenestrar D. João VI de Portugal. Duque de Caxias, ao responder com um genocídio a petulância do Paraguai em se apropriar do Mato Grosso – a justa causa elevou-o aos títulos de Conselheiro da Paz e Pacificador do Brasil. Marechal Deodoro da Fonseca, o proclamador da República, fechando a raia no continente americano quanto à extinção da monarquia e da escravatura, em que o segundo dos pedros foi melhor que o primeiro.
Na lista de espera se encontram Getúlio Vargas, agora visivelmente prejudicado por Olga, o filme, que revolveu a lama dos porões do Estado Novo. Juscelino Kubitschek, cujo sacrifício em favor da uma plena democracia só será reconhecido se comprovado o assassinato pela ditadura militar. A grande surpresa é, em nome do Acre, aparecerem dois nomes: o gaúcho Plácido de Castro, responsável pela conquista do território que estava nas mãos da Bolívia, e Chico Mendes, o seringueiro que introduziu o país numa nova ordem sócio-ambiental com a disseminação de reservas ecológicas – ambos assassinados.
Se a idéia era homenagear os construtores da liberdade em favor da pátria e a lista ganhar uma dimensão que não provoca orgulho, melhor seria optar por uma galeria de heróis desconhecidos, criando um museu com suas histórias significativas. Como a do pequeno grande herói de Erechim, Lucas Vezzaro, de 14 anos.
Um ônibus que transportava alunos da zona rural para escolas na cidade caiu em uma represa com oito metros de profundidade. Lucas estava entre os primeiros que conseguiram sair pela janela. Bom nadador, começou a socorrer os colegas, em vez de procurar a segurança da margem do lago. Primeiro, agarrou sua prima e a arrastou para a beirada; a seguinte não sabia nadar e estava se afogando; depois outra. Na quarta incursão não voltou mais. Os que se debatiam debaixo d’água puxaram-no para o fundo.
Não podia ver ninguém em dificuldade sem oferecer ajuda. A solidariedade como causa mortis, uma mudança nos padrões de heroísmo.

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Antonio Carlos Gaio
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