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O NATIVO

O nativo sempre foi desrespeitado, mal visto, até abominado, quando a terra que pisa desde que nasceu, nunca deixou de ser sua, sem precisar de títulos, notários e escribas, a tropa de choque da corte para legalizar a fraude em nome da civilização.
O nativo dá margem a clichês preconceituosos: irresponsável, safado, trambiqueiro, negligente, preguiçoso, lerdo, burro, explorador. Impropérios com os quais se xinga a população do Rio de Janeiro, Porto Seguro, Salvador, Maceió, Olinda, Recife, Acapulco, Cancun, Bali, Polinésia e Phuket, ao estender o conceito da praia para a periferia.
O nativo é o refúgio perfeito de mulheres reprimidas a quererem furar o bloqueio imposto por um estreito círculo social onde giram, perdidas, em busca de uma brecha para se esgueirar e escapar dessa sina. Como compensação, permitem que deposite o sêmen de suas fantasias.
O nativo, quando tratado como objeto que atiça a curiosidade da turista estrangeira, ou mesmo brasileira, de conhecer o toque retal do prazer, é remetido a uma condição sócio-econômica superior que o cega, ao elevá-lo às nuvens. Quando ela se vai, mal percebe que foi chupado e jogado fora como a um bagaço de laranja. Claro que irá ser chupado outras mil vezes, até o coqueiro parar de crescer e não dar mais cocos.
Uma tosca análise bastarda proveniente do preconceito, filhote da teoria nazista da eugenia, diria o presidente da Associação dos Nativos da Papua e da ONG de Trancoso. Mas isso não cola no terreno chão do sexo e costumes, pois exerce extrema atração desvendar mistérios, vencer o suplício de uma extensa escadaria e terminar na cama, seja da chinesa, japonesa, tailandesa, malasiana, taitiana, hindu, egípcia, marroquina, nórdica, espanhola, italiana, siciliana, mexicana, colombiana, venezuelana, peruana, brasileira, e, principalmente, das negras e mulatas, responsáveis pela miscigenação – ato final da redenção do ser humano – que embasbacaria qualquer clonada descendente de siliconada.
Pruridos elitistas de que cabelo bom não é crespo, alisar, alisar muito, ou esconder-se nos cachos e rastafári enquanto a mecha não vem, do arsenal de preocupações do senhor João Fernandes não constavam. Controller da comercialização do diamante em Diamantina, em nome da coroa – uma das versões mais antigas de dirigente de estatal -, passava por cima dessas questões, afeito na santa terrinha a não ficar por baixo.
Xica da Silva, sua concubina favorita, que o diga. Meteu-lhe treze filhos na bucha e no bucho. A crioula mais gostosa, sestrosa e de dentes tão bonitos, chegando ao cúmulo de mandar arrancá-los de sua maior rival, quando julgou ser esposa e ter marido.
Esgotado o veio, arrancado o dinheiro de quem podia espoliar, e chupada a laranja seleta, plena de doce suco que enchia sua boca de gozo, João Fernandes regressou a Portugal em definitivo e nos deixou essa herança.
Nativos, passados de mão em mão, descartáveis, coadjuvantes, pior, figurantes, excluídos que caminham por sobre terras improdutivas, à deriva, no farejo de um Antônio Conselheiro, Osama bin Laden ou, pensando grande, num exportador de guerra do nível de Che Guevara. Quem sabe até, sonhando alto, ressuscita-se Mao Tsé-tung na liderança de uma Longa Marcha de nativos rumo ao Grande Salto à Frente.

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Antonio Carlos Gaio
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