O ator Pedro Cardoso pronunciou um discurso contra a nudez no cinema e na TV. A nudez já foi uma conquista contra a repressão à vida sexual. Agora passou dos limites, tornou-se uma isca para atrair público.
Pedro Cardoso concita a uma Revolução dos Bichos, de Orwell, sem dar nome aos bois: até quando os atores atenderão ao voyeurismo e à disfunção sexual de diretores e roteiristas, que impingem cenas macabras para dizerem amém à indústria da pornografia? Não se sabe se foi em causa própria, já que Cardoso não fica à vontade quando nu em cena e nem acha que tirar a roupa é uma exigência do ofício de ator. Ou em defesa de sua namorada, Graziella Moretto, que fez sua primeira cena de nudez no filme “Feliz Natal”, na estréia do ator Selton Mello na direção de longas- metragens. Findo o desastroso Natal em família, Graziella finalmente consegue paz em casa, logo que apaga as luzes e, sozinha em seu quarto, contempla-se despida no espelho.
Selton Mello, o maior ator cinematográfico do momento, ficou numa saia justa, já que Pedro Cardoso chamou-o para um duelo ao afirmar ser freqüente que cineastas de primeiro filme exibam a amigos, em sessões privé, cenas ousadas que conseguiram arrancar de determinada estrela. A melhor resposta será um “Feliz Natal”, Pedro Cardoso!
Pedro Cardoso perdeu o humor. O espetacular e inteligentíssimo ator, que se notabilizou no besteirol, um gênero de teatro que marcou época. O comediante impagável que integra “A grande família”, no besteirol de sucesso da TV Globo. Quando cômicos se levam a sério ou vêm com teses, costumam perder a graça. Louco de amor, Pedro Cardoso não mais distingue a fronteira entre a fantasia e a realidade, pois seu coração bate num som diferente – a bossa nova.
Conhecedor do disse-me-disse dos bastidores do teatro da vida, deu uma de Dom Quixote e partiu de lança em punho para proteger sua Dulcinéia – a mulher que ama, nua e indefesa perante os olhos dos tarados que curtem cinema. Como no filme de Woody Allen, “A Rosa Púrpura do Cairo”, penetra na tela para resgatá-la da pornografia reinante. Como é lindo o amor! O sucateamento da profissão e a tênue linha que hoje separa a sétima arte da pornografia constrangem atrizes, cujo pudor é afrontado pela criatividade sem limites pois, em nome da poesia, pensam que podem tudo.
Mas a turma do contra é grande, a começar por Vera Fischer. Camila Pitanga nos deixou com um gosto de quero mais ao incorporar a prostituta Bebel, na novela “Paraíso Tropical”, a mistura diabólica de talento, beleza da raça negra e corpo maravilhoso. Diretores renomados se casam com jovens talentos e exploram seu belo corpo a torto e a direito, como o genial Polanski. No passado, Jane Fonda, Brigitte Bardot, Jeanne Moreau; no presente, a unanimidade dos gays, que não têm qualquer problema com a política do corpo. Senão teremos que retroceder ao tempo em que todo pintor devia comer as modelos, o fotógrafo não livrar a cara de socialites e a coadjuvante freqüentar o sofá do diretor para abiscoitar o papel principal.
Pedro Cardoso corre o risco de arrumar uma encrenca com o público, que necessita ver a nudez artística para aprender a se despir de seus preconceitos e de sua armadura, a olhar para si sem se achar estranho. Quer dizer que todo mundo nu na peça “Hair” ficou ultrapassado? O ator é quem vai discernir e determinar o que é nu artístico na cabeça de David Lynch, em “Cidade dos Sonhos”? É um retrocesso ao baixio das bestas pensar em controlar o ímpeto furioso do enfant terrible, Cláudio Assis, e nos impedir de apreciar os seios esculturais de Dira Paes, a grávida mais bonita que já houve na face da Terra. Ou a floresta amazônica de Leona Cavalli, sem um sinal de desmatamento, em “Amarelo Manga”.
Será que Pedro Cardoso não caiu na esparrela de escorregar do besteirol esperto para o entretenimento puro, desencantado com a realidade? De tanto sacaneá-la e não fazer efeito, voltou-se para o pastelão, priorizando a família e a criança, do outro lado da TV.
Será que Pedro Cardoso ficou contaminado pelo personagem que interpreta em “Todo Mundo Tem Problemas Sexuais”, no filme de Domingos de Oliveira? Apesar do título, não contém cenas de sexo explícito ou nu frontal, sequer um ânus. É sexo no divã da psicanálise.
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