Embora não gostasse de dar espetáculo ao beijar, ela tinha de reconhecer: esse beijo é de um frescor que encoraja o acasalamento!
Sem dúvida, ela quer esse homem. É o beijo que desperta alguma coisa a mais. Um beijo que tem gosto de quero mais. O beijo que provoca certezas. Um beijo fiel ao pacto amoroso, de olhos completamente cerrados, de modo que não haja uma fresta por onde desviar a atenção e a imaginação possa fluir no encalço do amor. Prolongado o necessário para resistir à ação do tempo e selar um compromisso visceral em que ambos só têm que dar satisfações um ao outro.
Pois é um beijo que transgride a família, invade o vizinho, pula de galho em galho, acelera os motores, avança o sinal, escala montanhas, atravessa rios, cruza os mares, avoa que nem avião, sai à procura de outros mundos, põe o bom nome do negócio em risco e trespassa o coração para que ele não se finja de morto. Não cabendo nenhuma palavra após os olhos se abrirem.
Um beijo que faz os astros regozijarem-se com a energia alcançada e a veia latejar na testa, com o engolir em seco e mastigar o vazio. A exalar um aroma delicioso. A própria flauta encantada que transforma o beijo num instrumento que eriça e erige; que ouriça e alevanta os ânimos. Um beijo que não está preocupado com a construção da família.
Quando, então, alimentamos uma tendência a nos recolhermos no instante em que um beijo dessa grandeza mostra suas credenciais. Tentamos minimizá-lo para nos proteger. O medo da entrega é cabeludo, desproporcional e escandaloso. Pois o beijo é eterno enquanto dura o amor nele contido. Beijo esse que não podemos abraçar para saber até onde vai o amor. Não está ao alcance de nossas garras.
O que impressiona no beijo que cala a boca de qualquer um é o seu alto grau de pureza, quando nos proporciona um ardor que leva de roldão os sentimentos mais indefesos e nos devora para demonstrar que não somos donos de nós mesmos.
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