A dor não o machuca à toa. Não se origina do nada. Não para de agredi-lo enquanto não arrancar de você o que tanto preserva. Visa a tirá-lo do seu falso ponto de equilíbrio. Fazendo-o ir ao ponto certo. Demovendo sua inércia em não querer se tratar.
Tomemos como exemplo a dor lombar ou cervical. Um mal que assola o homem desde que perdeu o contato com o andar, em razão de a automação ter nos deslumbrado e nos fixado com cola à cadeira para navegar no espaço sideral da internet.
A dor aguda é um processo fisiológico natural que serve de alerta para mostrar que algo não está funcionando bem no organismo, como sintoma de uma reação que clama por vir à tona e efetuar modificações urgentes na sua trajetória. Corrigir o rumo de sua viagem astral. Pois nos tornamos rígidos, não temos vontade de sair do lugar em que nos encontramos, seja por achar insuportável fazer exercício ou pelo simples fato de preferir se ocupar apenas com coisas que dão prazer.
Deprimido, sente mais dor. E pessoas com dor acabam possuídas pela ansiedade no afã de se curarem, o que só aumenta o inconformismo, por prenunciar a degeneração do esqueleto e a necessidade de alongá-lo para contrabalançar o definhamento irreversível. A dor se agrava e torna-se séria, induzindo-nos a pensar que somos feitos só de carne e osso.
Hoje, uma dor fina que o assusta; amanhã, um constrangimento qualquer que o paralisa; posteriormente, desarranjos orgânicos atritando como a sinalizar para se habituar devagar à libertação da alma ainda atrelada a padrões não condizentes com o que veio destinado a realizar nessa encarnação. A liberação dos fardos que carregamos em função de experiências que acumulamos e não sabemos digerir, requer uma elaboração vagarosa, para a qual uma doença longa no instrumento físico é uma bênção da Divina Providência que os homens, no futuro, saberão entender no que consiste – o privilégio de adoecer. Deparar-se com a demora indefinida para complementar o processo de fortalecimento do espírito e suportar o assédio das forças que vigiam a nossa existência para não esmorecermos. E vencer o embate físico que nos atormenta para nos sacar desse estágio e nos transportar para outra dimensão, que nos fará crescer e amadurecer, até para demonstrar que o livre-arbítrio é de nosso domínio – o que não quer dizer que sejamos donos de nossa existência.
Tudo o que provoca dor e sofrimento reclama ocasião a fim de restaurar sua alma e pô-la no caminho certo. Há que mexer nos seus hábitos, mesmo que politicamente corretos. Há que vencer sua resistência. Alterar sua fôrma. Descolar sua imagem de como sempre o compraram. Mexer no que lhe causa medo. Por que resistir à fé e só acreditar naquilo que vê, pode explicar e faz sentido?
O segredo é não fazer nada sem alegria, sublinhando o bom humor em cada gesto ou comentário, com ânimo redobrado para vencer um mundo que desanima e nos adoece só de pensar como tem gente maquinando para dar tudo errado. É quando a dor se manifesta para nos testar se dobramos a espinha dorsal a dúvidas, incertezas e pessimismo. À falta de fé.