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BURRO METIDO A INTELIGENTE

De tão metidos a inteligentes, eminências pardas, vossas excelências e garbosos jornalistas acabam burros. Teimam por se julgarem brilhantes. A sua palavra é que tem que prevalecer. No auge do orgasmo discursivo, seu palavrório cega o ouvido, não percebe o mau cheiro dos olhos e mal enxerga com o nariz, trocando todos os sentidos básicos por não saber calar a boca guiado pelo umbigo. Se empobrecendo ao deixar de entrar em contato com um ponto de vista interessante e distinto do ângulo em foco.
Põe banca, impostando a voz de uma pessoa segura e realizada, que não deixa margem a dúvidas. Um zero à esquerda que esconde o blefe que se tornou através de uma boa formação cultural, conhecimento de línguas e tudo que a tecnologia disponibiliza para convertê-lo no eclético economista que saca soluções mirabolantes, a exemplo dos vírus que infestam os computadores. Sua linha de raciocínio traduz-se num cálculo matemático que redunda numa lógica fria que disfarça suas deficiências emocionais, sua auto-sustentação sempre dependente do outro. Fato esse que jamais reconhecerá, salvo quando imerso numa crise equivalente à morte. Como, por exemplo, ao se deparar com uma separação ou má receptividade do público que julga cativo.
Chama o irmão mais próximo de idiota de plantão quando procura uma verdade na ideologia que o absolva e o justifique, uma certeza no mar de insegurança em que nos atolamos. Na santa paz de que em terra de cego quem tem um olho é rei, a mente brilhante classifica os comuns de esquizofrênicos com uma lógica de perito que finge aceitar as diferenças. Um mal inevitável que ele tem de suportar para controlar suas ansiedades com surpresas no sucesso, no amor ou na sexualidade.
Jamais imagina que um dia irá morrer. Deus não seria injusto, logo com ele.
Desdém pelos fracos, intolerância com os burros, nivela os zés-manés a boçais e babacas e se irrita com os caretas, por uma questão de simetria. Para que não tenha que explicar o seu próprio lado torto ou a toupeira que encerra seu narcisismo, de estar vendo o que ninguém mais vê. Uma angústia típica do desamparo desembesta por seus labirintos de inteligência e o embrutece. Adora se mostrar politicamente incorreto, um artista na acepção da palavra, uma máscara atarraxada que denota uma idéia fixa em manipular os burros que o escutam, nem que seja para malhá-lo, uma armadilha que envenena e os transforma em virulentos adversários.
“Bem-aventurados sejam os pobres de espírito”, uma entre dez escolhida para tripudiar e esmagar feito barata, faz parte do princípio que permeia uma mentira inteligente a mascarar o mundo. Coloca no mesmo balaio espiritualidade, inquisição, catequese, castidade, Papa, crente, o pecado original – a lavagem cerebral, por excelência -, para valorizar o pensamento livre e banalizar o fascismo religioso – é tudo charlatão! Foge como o diabo da cruz, sua própria ignorância ativa.
Por ser autocentrado, não tem medo do que diz, sujeita-se a atrair o ódio. Baseia-se na polêmica que seduz. Medalha de ouro para o fascista, quando cospe marimbondos na defesa de suas idéias. Quando abusa de eufemismos, para o engenheiro, ao não admitir a ponte que partiu ou o bateau-mouche que afundou. Quanto cinismo, ao advogar causas de ratazanas, raposas e lobos em peles de cordeiro. Parabéns ao agiota, banca a jogatina com que transformamos a vida num jogo de azar.
Seu grande desejo é se transformar num encantador de serpentes. Ao engabelar a todos com sua fluência, seu horizonte ilimitado e intelecto privilegiado. Nos colocando no lugar de cinderelas a babar pelo príncipe encantado.

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Antonio Carlos Gaio
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