Encontra-se em pleno curso a formação de uma nova raça, calcada no centauro, a matriz, substituindo o cavalo pelo cão matador domesticado pelo dono que se confunde com o cachorro, seu fiel amigo, num autêntico remake do “Médico e o Monstro”. Os hormônios alardeiam que somos metade homem metade mulher numa velocidade de transformação adequada aos nossos tempos, em razão inversa e proporcional ao pavor que o hermafroditismo e a androginia provocam em plena era da clonagem, contribuindo para delinear um quadro funesto e sombrio a respeito da instabilidade dos papéis e valores atribuídos aos sexos desde que Adão e Eva comeram aquela maldita maçã.
Seu ancestral mais famoso, Cérbero, o cão de três cabeças que guardava as portas do inferno, contribuiu muito para essa simbiose entre o racional e irracional, que materializa-se a olhos vistos circunscrito a um caráter esculpido na fôrma de irmãos siameses, intimamente unidos por temperamento e predestinados a irmãos uterinos.
A identidade é de tal tamanho que o poder público viu-se encostado na parede a ter que cadastrar esses verdadeiros animais, a promover esterilização, num limite perigosamente próximo da emasculação, a tornar obrigatório o uso de focinheira por cima das ventas, a circular com o enforcador, e proibir o direito a menores de conduzi-los que, por não terem força de segurar o bicho, dispensam a coleira – um claro e bruto incentivo à conversão em pitboy.
“Disque cães bravos” e denuncie o PitBull, Rottweiller, Doberman, Fila Brasileiro, Bull Terrier, Dog Alemão, Pastor Belga, Mastim que irá assassiná-lo, enchendo de orgulho seus donos que não são homens para confessar que já perderam o crédito na nossa raça, humanidade que não vale um níquel furado. A prova confessa do crime é a débil declaração de que “meu cão nunca fez mal a ninguém”, tratando-o como se fosse um igual, sendo a coleira um instrumento sadomasoquista inadmissível. Se as mulheres usam coleira como artefato de submissão aos homens, o problema é dessas infelizes.
Dêem-se por satisfeitos os desprovidos de cães, porque os que os têm já recolhem as fezes expelidas nos passeios públicos, livrando-nos com os nossos passos de aumentar a dimensão do juízo falso a respeito de gente tão diferenciada que nos parece estranho.
Esses cachorros filhos da mãe desnaturada que protege esses marmanjos, dilaceram a dentadas seu cãozinho de estimação Yorkshire; põem a perder o gajo que atira contra o pitbull que atacava seu cavalo e atinge um menino de 10 anos; morde seu dono que tentou evitar que ele matasse um Poodle Toy; dando uma de cavalo, Braddock puxava seu dono, lutador de vale-tudo, no skate, quando não resistiu à perna do gari; o guarda-vidas foi obrigado a matar a pauladas um pitbull que perseguiu o surfista mar adentro, após destruir sua prancha a dentadas; em briga de trânsito, o lutador de jiu-jítsu resolveu se poupar e incitou o seu cão contra o motorista oponente.
O código penal promulgado pelo mulá Omar em rasa troca de idéias com Osama, exigia barba comprida mas proibia cabelos à la Beatles; ai de quem pusesse pipas para voar e subisse o muro para espiar a mulher do vizinho; que se recorte os olhos de modelos nos frascos de xampus; médicos só podem olhar as partes do corpo das pacientes que precisassem de tratamento; se a esposa saísse de casa com a face descoberta, sua casa seria marcada e seu marido punido; chicote para quem saísse da linha.
Em sua frieza, o que mais impressiona nessa estirpe de homem é a vocação para confinar as mulheres, a mulher que habita em seu seio, apegado a seu código de valores inspirados em decálogos anciãos que se esboroaram no tempo, saudosos de ressuscitar epopéias brilhantes que só o feudalismo medieval constrói.
Devemos dar-lhes adeus acenando lenços, trata-se de desespero de causa usar o animal para assustar as pessoas, rola uma lenda de ervas daninhas que essa alma danada irá incorporar a cadela maldita rumo a uma nova vertente de centauros que, em alcatéia, expulsará os vampiros do nosso reino, seja feita a Vossa Vontade.