O futebol não cansa de dar balão e liquidar com os donos da verdade que falam grosso em seus prognósticos, emplastrando suas caras com tortas saídas de padarias tão-somente para lambuzar aquele ar arrogante e esnobe de expert.
Justo o que aconteceu com a França. Se com berço esplêndido sempre andou de salto alto, imagine a banca de rei do futebol só porque se julga inserida na restrita elite de Brasil, Alemanha, Itália e Argentina, sempre respeitados não importa a qualidade do plantel. Se a mística da garra do Uruguai já foi para o espaço com o maracanazo de 1950. Até o senegalês Vieira, naturalizado francês aos 16 anos, que sentenciou a decadência do Brasil, não levou fé na pátria que renegou: qual é a relevância de ser vice-campeã da África, se a totalidade de seus jogadores disputam o campeonato francês?
Cegueira maior só a da Dinamarca ao trocar as lentes de Martin Laursen em pleno jogo com o Uruguai durante longos 5 minutos, o que nos concede a honra de sermos senegaleses desde criancinha. O Rio 40º consagrou o calor senegalesco, desculpa joão-sem-braço para calar a antiga campanha difamante sobre a indolência e preguiça do brasileiro, exceção feita aos trabalhos sexuais. Contudo, não seríamos capazes de imitar o libanês recém-casado Louay, que pediu dispensa de seus deveres conjugais durante as transmissões da Copa, no que a esposa acedeu se retirando para a casa dos pais.
Do mesmo mal padece Roberto Carlos. Em sua incontinência verbal se arvora em ocupar a posição de psicólogo, ao invés de lateral: para quem conhece um pouquinho de futebol, com 60% de nossa capacidade, somos imbatíveis e vamos dar espetáculo. Com o rei na barriga, o castigo veio a cavalo. O rei dos treinos, Emerson, madeira de dar em doido, é cortado da seleção ao luxar o braço como goleiro numa peladinha descompromissada.
Improvisação sem talento resulta em estresse, que mal disfarça a pressão com que uma competição desse naipe brinca de gato e sapato com o atávico sentimento de inferioridade que nos persegue, para que ousemos tirar os pés do charco.
Uma das formas de enfiar a carapuça de superior é correlacionar a conquista da Copa a epopéias heróicas, como os turcos realçando seu pedigree com a extensão do Império Otomano. Não chegam a vestir os minaretes das torres de mesquitas com camisetas ou imagens da seleção, Alá não suportaria tais palhaçadas. Agora, dar balão no Roberto Carlos com a bola presa entre os calcanhares, isso pode. A presepada nos estertores finais da partida para fazê-lo engolir em seco sua língua de trapo não é despir um rei e colocar outro. A derrota no lombo já estava sacramentada, a expulsão de dois turcos e a agressão aos países baixos de Rivaldo evidenciaram a chinelada.
Que se amplie o conceito de país de opereta no futebol: o Equador. Depois de brilhar nas eliminatórias e alcançar a glória de disputar sua primeira Copa, virou macarrão na boca dos italianos em 20 minutos. Tanta luta para morrer nas praias da Ásia. Lembra a senhora Regina Célia, em fase de transição para conquistar um novo marido. Organizou uma grande festa, alugou uma bela casa, tomou a frente da decoração e dos convivas, contratou uma grande orquestra cujos últimos acordes coincidiriam com o derradeiro casal, se esmerou nos quitutes e no sortimento de bebidas, pôs seu melhor vestido, recostou sua cabeça no travesseiro para rememorar o prazer em cada detalhe da organização, e sonhou… até acordar no dia seguinte.