Confúcio viveu no século VI a.C desenvolvendo idéias difundidas graças aos céus que conspiram a favor. Essa falta de lógica quase coerente refletiria a grande força do confucionismo. Quem poderia provar que estava errado, se, com astúcia, poder-se-ia usar para provar que quase tudo estava certo. Ao longo de sua vida pleiteou um cargo administrativo elevado para que pudesse colocar suas idéias em prática. Imagine se os boas-vidas dos governantes iriam dar uma chance ao desmancha-prazeres para interferir em seus domínios. Ninguém emprega jovens sérios e honestos que acreditam ser possível dividir o seu vasto conhecimento com o mundo.
Decidiu fundar uma escola que iria ensinar administradores políticos a governar. Era essencialmente um professor de moral, como se comportar de forma adequada se o que se desejava era governar as pessoas. Primeiro, deveriam saber como governar a si mesmos. Obteve sucesso devido à sua personalidade carismática com aulas ministradas à sombra de árvores: “o homem superior é comedido em palavras mas não em realizações”, “quem não corrige seus erros torna-se ainda mais errado”.
No entanto, nem todas as palavras de Confúcio foram banais, algumas são controversas, outras obscuras ou enigmáticas, mas no fundo, “quem não conhece o valor das palavras jamais compreenderá os homens”. Cadê o eco?
Sua educação certamente influenciou a arte de governar e cumprir com as obrigações da mesma forma que um pai deve ter para com seu filho. Uma revolução comportamental buscando o máximo na virtude, em amar o próximo, o preceito moral mais profundo da humanidade, proferido por Confúcio quinhentos anos antes do nascimento de Cristo, sem nenhum sentido religioso.
Muitos alunos de Confúcio se tornaram administradores de grande sucesso, assim que entravam em contato com a realidade do poder, deixavam de lado seus princípios. Mal que ainda se pratica hoje.
Desfez a lenda de que os governantes eram descendentes de ancestrais divinos, atuando por decreto celeste. O Estado deveria se tornar um empreendimento cooperativista, em benefício de todos. Dissuadiu seus senhores de se envolverem em guerras irracionais com cidades-estados escravas que rompiam constantemente suas alianças para dar vazão a massacres, orgias e depravação, de forma a não se reduzirem à miserabilidade de disputas sem-fim.
Se libertos desse sofrimento advindo da violência, a sociedade fatalmente iria mudar, deixando de ser usada como mero pretexto para os excessos de seus governantes. Paradigma do qual não nos libertamos ainda.
Finalmente, aos 50 anos, foi nomeado Ministro do Crime, e aplicou a pena de morte com tal rigor que os ladrões desapareceram, estendendo-a inclusive àqueles que inventavam roupas fora do comum a quebrar uma harmonia sempre respeitada nos costumes chineses – Mao Tsé-tung, que o elegeu como o seu maior desafeto, o imitaria na Revolução Cultural. Passou dos limites quando exigiu que nas províncias os homens só andassem pelo lado direito da rua, para que não se misturassem às mulheres, à sua esquerda.
A classe dominante não aproveitou o que seria considerada a maior sabedoria de todos os tempos na China, sem aceitar um único suborno ou jamais trair seu senhor junto aos seus inimigos. Seus ensinamentos determinaram as normas de conduta e foram o alimento espiritual da burocracia chinesa, se transformando numa religião por força de sua moral e ética implantadas, o que certamente contribuiu para a sua longevidade de mais de 2 mil anos.
A China de Mao extinguiu a China de Confúcio, em que o tédio era uma benção, sossegadas as propinas e a infidelidade política. Confúcio morreu lamentando que ninguém o entendia, julgando-se um fracasso, “os únicos que jamais mudam são os sábios e os idiotas”. Quem somos nós para contrariar alguém tão sábio?
Quem falou tanto em esperança e governa com medo não tem uma escuta boa para Confúcio: “o homem realizado procura o que existe dentro de si, o frustrado procura o que aparece nos outros”. Necessita da aquiescência de fantasmas que já sentaram no trono e de múmias que negociam poder, uns desmancha-prazeres que banem radicais, evitando chegar à raiz dos problemas ao dar um tiro no pé.