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DA IMPORTÂNCIA DE LER ANTES DE ASSINAR EMBAIXO

Até um analfabeto sabe que não deve assinar nada sem saber o que está escrito. Para assinar embaixo sem ler, só tendo vendido sua alma ao diabo. O que está em questão não é a inteligência para não saber o que se passa debaixo de seu nariz, é o rabo preso e a manipulação a que você está sujeito, daí seres culpado pelo que fazem aqueles que vos cercam. Seria ingenuidade supor que a impunidade fará o sol nascer todo dia, por não ser de todo absurdo que amigos de longa data, ex-esposas, filhos, sócios e apadrinhados venham a traí-lo, transformando-o na mais nova vítima do destino.
Não foi por outro motivo que Ted Turner e Jane Fonda se separaram sem que um tenha ido à cara do outro graças a um contrato pré-matrimonial cujas negociações se desenrolaram por um ano. E não venha me dizer que Jane estava de olho na grana do Ted que insinuações desse gênero não colam na militante aeróbica pró-Vietnã e feminista que emudeceu anos diante de um casamento tradicional e agora procura emprego em Hollywood. Mau exemplo, um gaúcho quis se casar com separação total de bens e ela rodou a baiana: “Não sou uma reles caçadora de dotes, você não é nem um pouco romântico, já está pensando na separação antes de se casar, você nunca mais será o mesmo para mim”. Sopra-se o tempo, o divórcio litigioso, a partilha encarniçada, inimigos para sempre. Não podem nem mais se ver, muito menos saber se tem nova esposa ou marido no pedaço. Não concebem como foi possível um ter feito parte da vida do outro. Ler o contrato guardado em baixo do travesseiro removeria o amadorismo contido na rejeição entre dois seres que já foram tão unidos por amor, amizade e companheirismo.
Amor em tempo de romance que se esvai. É impossível ler todos os papéis que assinamos, face à riqueza de detalhes que existe em tudo que se lê, seja para assinar ou não. É impossível ter ciência do cipoal de ações, atos e fatos, a responsabilidade é de quem nos cerca e nos remete toda essa papelada que se acumula em cima da mesa. É desumano saber tudo que se passa a todo tempo, isso vale desde o Presidente de República até o catador de papel. Contudo, você é responsável pelas suas escolhas, senão a fama de completamente podre e comprometido corre à solta. Quem não tem competência não se estabelece, se não sabia deveria saber, já que és tão zeloso na defesa de seus interesses corporativos, caso contrário é vista grossa às atitudes de quadrilhas que costuram esse país no cicio das tramas.
Imaginem se nós começamos a não cumprir contratos que firmamos, a não pagar as dívidas que assumimos e a não criar os filhos que registramos, apenas pelo fato de levar nossas assinaturas. Nada que surpreenda, pois os bicheiros ganharam credibilidade ao fazerem valer o escrito, e atualmente entraram em declínio. E todos nos tornamos cúmplices da passividade em cobrar direitos, garantindo a tranqüilidade de quem só tem compromisso com o rei posto na barriga.
Retinas eletrônicas, córneas cultivadas em laboratórios, terapia genética que corrige o defeito de visão herdado nos fazem sonhar com o dia em que a cegueira vai ser um mal superado. Num passe de mágica como o espelho que reflete a realização dos desejos de quem nele se mira da escritora inglesa campeã de vendas Joanne Rowling, em seu quarto volume da série Harry Potter – as aventuras de um menino bruxo -, calhamaço de 752 páginas de literatura infantil.
Ah, se eu pudesse requisitar a sensibilidade derramada nas fotos de Sebastião Salgado para decifrar o que a gente vê, lê e interpreta no que se assina embaixo sem ler, através dos refugiados, órfãos, zapatistas, sem-terra, nos campos de concentração do Afeganistão, Índia, Moçambique, Sudão, Angola, Albânia, Bósnia, e Brasil.

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Antonio Carlos Gaio
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