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“DEMOCRACIA EM VERTIGEM”

“Democracia em vertigem” só está disponível na Netflix. O magnífico documentário de Petra Costa, filha de pais que participaram da luta armada contra a ditadura, descendentes da família Andrade (seu avô), que fundou uma empreiteira com a família Gutierrez em 1948, a qual resistiu aos abalos da Lava-Jato. Porém, ela ressalta no filme que a família Andrade votou fechada com Bolsonaro, como não podia ser de outra maneira. Considerado um dos melhores do ano pelo New York Times com grande chance de concorrer ao Oscar em 2020, cuja versão do impeachment na presidenta Dilma, prisão de Lula e a eleição de Bolsonaro é abraçada no exterior e aqui considerada de esquerda pela Cora Rónai. Embora pareça se encaminhar para dissecar somente o impeachment de Dilma, a personalidade e a história de Lula, desde o seu início, logo tomam conta da tela em pinceladas que não o conectam a uma biografia. Com amplo acesso à intimidade dos presidentes Lula e Dilma, de forma nunca vista antes, como a noite em que Lula consolava apoiadores desolados, preparando-se para dormir sua última noite em liberdade em um colchão colocado ao chão. A diretora também revisitou a complexa trajetória de sua família para tentar entender como o país rachou, analisando a ascensão e queda desses governantes e a consequente crise política que se seguiu no Brasil com manifestações a favor e contra. Claro que adeptos do Moro, Aécio ou Bolsonaro teriam realizado um outro filme sobre um dos momentos mais dramáticos e turbulentos da História do Brasil. A mãe de Petra, muito esclarecida, consegue fazer leituras políticas que trazem novas luzes aos fatos, mas sem viés intelectual. Talvez a maior revelação seja sobre Dilma Rousseff, que foi de uma das presidentes mais populares do mundo (79% de aprovação em março de 2013 e 4,3% de menor taxa de desemprego de todos os tempos, em dezembro de 2014) até sofrer um impeachment em 2016, ao que Dilma acrescenta que não pôde governar em 2015, já reeleita, por conta da deposição a caminho. Opiniões favoráveis às pedaladas para justificar o impeachment estão presentes, bem como a análise de Gilberto Carvalho, conselheiro de Lula, reconhecendo os desvios ideológicos derivados dos governos de coalizão, quando não os relacionados à corrupção e ao financiamento de campanha. Impeachment ou golpe? Lula na cadeia ou Lula prisioneiro político? Moro e o consequente sentenciamento de Lula para impedi-lo de se candidatar às eleições de 2018. Os escândalos de Aécio e Temer são abordados, Bolsonaro surge como consequência da crise. O único mistério, ainda intocado, que Petra Costa deixou passar batido é de quem estava por trás das passeatas que, inicialmente, reivindicavam uma diminuição de 20 centavos nos preços das passagens de ônibus em São Paulo. Que se espalhou e assolou o país em 2013, compostas de radicais de esquerda, deixando um rastro de vandalismo, em companhia da mesma classe média que viria às ruas em 2015 para exigir a saída de Dilma. Como levantar objeções quanto à isenção de Petra Costa em seu filme, se Moro, considerado o paladino e herói da justiça, começa a ter sua honestidade questionada com provas baseadas em interceptações de mensagens de sua entourage e não mais com convicções pautadas pela dúvida se Moro era juiz ou promotor. O filme de Petra Costa emociona tamanhas as injustiças cometidas, a hipocrisia a vivo e a cores irrita, mas ficou a certeza de que a História do Brasil um dia porá tudo em seu devido lugar. Pois não será escrita por dementes.

Antonio Carlos Gaio:
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