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É DOCE MORRER NO MAR

Mulheres de meia-idade depositaram no sarcófago os conselhos e orientações de suas mães e avós, indo buscar a felicidade nas mãos de toscos homens criados na rede de pesca, à sombra de uma pedreira, ensurdecido pelo ruído da serra ou sob o ritmo da aceleração do automóvel.
Mais vale um pássaro na mão do que dois voando. Mais vale um “bom dia, madame!” de um mestre-de-obras e um motorista de madame que melhore a linguagem e aprume o vestir do que homens de seu próprio meio, que só têm olhos para garotinhas ou padrões estéticos que exaltem a beleza lapidada. De que adianta serem sofisticados e cultos, se não te dá o menor carinho e não diz que te ama, tamanho o grau de insatisfação com essa mulher cheia de vontades, caprichos, destemor e paranóia de ser feliz.
Geralmente bem-sucedidas e mais velhas que seus parceiros, acreditam que a diferença é tão brutal que não há espaço para disputas, vive-se apenas o sentimento, levanta-se o ego e goza-se o afeto. Ao se descobrirem vítimas do próprio preconceito, julgam poderem ser mais livres do que eram antes, na vanguarda dos acontecimentos.
O que importa é esse homem, tal como veio da Natureza, acreditar nela, apostar em ti, pedir para ensinar o caminho das pedras, à mestra, com carinho. Que a valorize, nem julgue um ímpeto dominador ensiná-lo a usar corretamente os talheres e selecionar sua literatura. Em troca, o afeto se encerra em aprender a preparar chá de mato e remédio de folhas, espiando a natureza com outros olhos.
O maior barato é a casa dele não ter chave e comer peixe com a mão, passear de mãos dadas de manhã para comprar pão, pedir à mãe dele sua mão em casamento, vê-lo tímido diante da família dela, é não deixar ele gastar o que ganha na casa, seu dinheiro cabe todo no bolso. Através da poesia, procura desbastar as desigualdades e polir o tosco.
Ter acesso ao mundo proibido é retribuído com o corpo em total sintonia que faz a cabeça delas, porque as amam e admiram. Entrecruzam os olhos num bar, ela o leva para casa, se iniciam no chão e estendem ao mar, na madrugada de lua cheia, em meio a peixes que pululam de alegria diante do arrebatamento que as remete para uma outra galáxia, o sexo odissêico.
O grande divisor de águas é a televisão, recurso ainda utilizado para despender a noite, afinal, céu estrelado, sessão após sessão, entedia. Romance versus ação, informação versus esporte, novela aglutina, o que significa o Oscar? Pode me explicar?
Para que fazer tempestade em copo d’água? Se a Stéphanie de Mônaco matou de desgosto sua mãe ao só se interessar por seguranças e domador de leões, logo a princesa Gracie que se casou com Rainier pensando em viver um conto de fadas. O melhor a fazer é relaxar, curtindo seu pedreiro no Opala de vidro ray-ban.
O mar… quando quebra na praia, é bonito… é bonito, e Dorival Caymmi faiscou os olhos de pescadores, que pularam fora de romances e tornaram realidade o amor entre mulheres ricas e homens pobres. No entanto, o compromisso de comprar um barco juntos se desfaz no descompromisso de voltar do mar sem peixe, tão lépido e fagueiro quanto o que será amanhã.
O feminismo abriu inúmeras vertentes irreversíveis cujos verbos não conjugam a sem preocupação no presente, o amor prevê resultados. Se trabalha e não ganha é pra ficar louca, o fantasma da dona de casa ainda ronda, ter filho é sinônimo de dar uma formação melhor a que recebeu, mas como, se ele, cada vez mais, é ancestral e naturalista, meio-termo não faz parte de seu dicionário, só lhe apraz amar ou não querer.
E se ele um dia cismar com os inúmeros momentos felizes, sentindo-se bloqueado, por não estar à altura daquela mulher bonita e gostosa? Cansado de ser aluno e protegido das intempéries dessa louca vida de querer tudo que já viu no cinema e na TV. Se for para viver o personagem de mero objeto a serviço de sua valorização, é melhor saltar fora e casar com uma moçoila do arrabalde.
É doce morrer no mar, canta Caymmi, enquanto você atina com o cachorro idiota e pinel que começa a dar voltas em torno de si mesmo, mordendo o rabo atrás de uma pulga que ninguém vê.

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Antonio Carlos Gaio
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