O modelo de mulher adotado na cultura cristã procurava encaixá-la na Virgem Maria. Sem pecado e submissa ao destino, de infinita bondade e compreensão. Ultrapassado.
A declarar que os homens não sabem o que fazem, só resta perdoá-los, já que fomos concebidos à imagem e semelhança do Pai eterno. Validade vencida, pois nem ruindo seu pátrio poder abdicaram da coragem que se julgam investidos para, ainda, se identificarem com super-heróis dos quadrinhos.
Segundo os livros sagrados escritos por apóstolos em uma linguagem patriarcal, em que abundam violência e vingança implacável, num universo tipicamente masculino de Pai, Filho e Espírito Santo. Falta-nos descobrir por qual porta entrar na Bíblia para encontrar a paz, que também se tornou uma guerra em busca de amor, sexo e amizade no lugar de Pai, Filho e Espírito Santo. Porém, um certo gosto de sangue na boca insiste em não nos abandonar, o que equivale a não querer ficar para trás um do outro e dificulta os relacionamentos, mais competitivos do que nos tempos de antanho.
São invasões de privacidade sem hora marcada e batalhas sem fronteiras, num terreno sem dono, com julgamentos cruéis e sem compaixão. Os homens na sua eterna vontade de serem perfeitos, divinos e justos para serem absolvidos da enorme culpa que carregam por conta de traições e graves conseqüências. Quantas travessias para não alcançar terras proibidas e territórios sagrados.
O homem como centro das atenções, o único, o grande imperador, a eterna figura do Pai, passando o bastão para o Filho, ambos dispostos num grandioso altar. Acima do Bem e do Mal, as demonstrações de força bruta, um atributo exclusivo dos homens, mistificado por uma consciência crítica que não se descobre quando matam uns aos outros.
Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, o homem se encontra dividido. Entre se exercer na ética ou no prazer. Entre lavrar a colheita com tamanha simetria e regularidade que se torna monótono, e não degustar do prazer diante do inexorável caminhar para a morte. Ele precisa do balizamento, do farol que ilumina o horizonte e do porto seguro, pois não está preparado para lidar com perdas e frustrações, muito menos para a extinção do objeto de seus escravizantes desejos.
Por isso, soa como uma ameaça, uma assombração, quando a mulher resolve desenrolar suas tentações, obsessões e desejos inconfessáveis, enfim, desvelar seu mistério. Ele interpreta como uma pedreira maior que a sua para desbastar. Não suportaria viver ao lado de alguém com tamanho complexo em verbalizar ao cubo intimidades que não caem bem numa mulher de nível, ao seu feitio. Não decifraria nem seria de seu agrado, além de inferiorizá-lo e porventura colocá-lo face a face com um rival que abra seus olhos para essa mulher interessante e atraente que nunca enxergou.
Ele não agüentaria ela contar porque se deixou enlaçar por aquele tipinho que não dormia sem estar emaranhado em seus braços e pernas e que a beijava sugando-lhe toda a sua alma para misturá-la ao seu eu. Ele não suportaria atestar o olhar dela desviado para quem conseguiu penetrar em sua anima. Não foram apenas as roupas largonas que quebraram o seu formalismo: ela exalava um ar desperto que despachou para bem longe a songamonguice necessária para se encaixar na educação recebida de seus pais. Isso o assusta, a faculdade adquirida dela se deslocar sem maiores embaraços e alterar a marcha dos acontecimentos sem depender de consulta prévia. Se considera demitido do lugar de consultor, conselheiro e sábio. Perdeu a ascendência sobre quem nutria uma fixação, uma fé cega, o deslumbramento que caracteriza o grude. Também pudera, tão logo se despediam, ela sentia saudades na primeira esquina.
Orgulha-se de não se enganar com o sorriso feliz dela, apesar de tentar depreciá-la. Em vão. E se socorre na masturbação. Um vício que derivou da adolescência para interromper o coito antes da ejaculação. Preventivamente, para evitar surpresas. Os filhos abortados antes da concepção agradecem tamanho sacrifício.
Deixe um comentário