As velhinhas sentem uma sensação de abandono nas proximidades do Natal. Reclamam muito de parentes e amigos não mais se lembrarem delas.
Mesmo porque já não possuem a mesma saúde para se fartar no Natal e esquecer os desentendimentos que não cessam de corroer a família.
Mal conseguem se firmar por sobre joelhos penando com artrose.
A aparência não mais as preocupa mas sobra carinho, necessidade de serem abraçadas e beijadas por ombros amigos que as amparem em seu declínio, denunciado por arquear seu corpo, mas não necessariamente seu espírito.
Já não mais se encantam com brinquedos, mas uma lembrança de Natal que seja faz com que se sintam menos invisíveis. Ainda partícipes do mundo atual. Por não mais ouvirem o que pensam, o que acham da pobreza atual, se é mais miserável do que antes, se julgam inúteis. Se as epidemias se renovam para levá-las daqui. Até que se descubra uma vacina, é sobreviver sob o fio da navalha.
Netos servem de consolo, bisnetos a perder de vista. Mães, avós, bisavós, uma longa trajetória. Quem canta, seus males espanta. Só cantando músicas de Natal, marchas-rancho de Carnaval, de Roberto Carlos, cantos sacros que as religuem ao mundo, preenchendo seus espaços vazios, cansadas de ser, sozinhas, guiadas pelo seu bem-querer, e aninhando-se no passado, pois só o amor lhes ensinou onde iriam chegar.
Essa é a maior lembrança com que o Natal poderia lhes presentear, rompido o lacre da memória. A nostalgia dos bons tempos. Tornar a desfrutá-los tal como se apresentaram à época, sem que nada de ruim os tivesse estragado. Reconstruir uma outra vida no campo fértil da imaginação. Por que não? Se corrigidos alguns detalhes com a percepção de hoje. Não é material suficiente para ocupar uma mente solitária? Redescobrir seus passos onde houve paixão, o amor de verdade. E por que não puderam canalizá-lo em seu leito natural. Cultivar em suas margens e colher seus benditos frutos. E ficar em dúvida se desperdiçaram suas vidas.
Feliz Natal!
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