Eu acho. Eu acho que devemos tentar compreender as manifestações dos eleitores de Aécio, não tanto pelo lado do desespero que os leva a tentar o impeachment ou a inelegibilidade através da capa da revista Veja, mas pelo irrefutável comportamento ideológico que não deixa margem a dúvida, elogiável sob todos os aspectos por ser transparente. Como talvez jamais tenha sido se compararmos com a Marcha da Família com Deus pela Liberdade que antecedeu o golpe de 1964 ou com o duelo entre Collor e Lula decidindo as eleições de 1989. É bem verdade que havia o comunismo com elementos satânicos a se perseguir. Agora não, é essa gente pobre e esperançosa que gostou de ser assistida pela primeira vez pelo poder público de forma assumida, bem como a classe média de Lula que atrai o ódio e o inconformismo com a atenção e a prioridade aos menos afortunados. É o famoso confronto nominado por Lula de “nós contra eles”, dos pobres contra os ricos, respectivamente. Da luta de classes a qual os tucanos e a mídia evitam mencionar, preferindo mascará-la com “somos todos brasileiros”. Quando pomos os pés na rua é que constatamos que a decantada cordialidade do povo brasileiro não mais perpassa os conflitos latentes na ida ao trabalho e no retorno à casa. Os desaforos encetados desde a abertura da Copa do Mundo mandando a presidenta tomar no cu até Dilma vir a vencer as eleições custaram caro, levando-os ao desespero do golpismo e à promessa de desestabilizar o governo de Dilma, fazendo valer seus superpoderes de classe mais abonada, mais esclarecida, mais bem informada, e que é patrão e por isso mesmo emprega essa imensa massa de nordestinos e nortistas, colocando-os sob seus tacões. E com seus impostos, embora sonegados e reclamando da alta carga tributária, sustentar o Estado e sua imensa fauna de aposentados, propondo até a separação e a divisão do Brasil em duas macrorregiões, o Sul e o Norte – à semelhança da Alemanha Ocidental e Oriental e da atual Ucrânia, predominando a ótica da Guerra Fria. Ou seja, se não vai na base da democracia, vai na força. O que deixa Dilma sem alternativa. Se for para esquerda, até para refundar o PT, aí é que encontrará maior resistência. Se buscar o equilíbrio e o diálogo, será massacrada em nome do povo de dois salários mínimos que nela votou maciçamente. Como já foi torturada pela ditadura militar, saberá lidar com a pressão oriunda dessa caterva que teve o desplante de vestir a camisa da Seleção Brasileira para votar em Aécio como se patriotas fossem, e, ao mesmo tempo, ameaçar deixar o país no caso de derrota se assim pudessem, pois essa democracia não mais os representa em virtude de o que está no poder é o regime do PT. Embora Dilma tenha demonstrado em campanha que terá jogo de cintura para enfrentar uma metade do país que acredita que a corrupção foi a grande vitoriosa, a guerra já está declarada. Como as manifestações deverão voltar face ao nível baixo do Congresso eleito, teremos que passar o país a limpo. O que é saudável é que todos terão de mostrar a sua cara, exibir seus preconceitos, dar vazão a maledicências, expor suas ideias trocando o tosco pelo racional, se conseguirem.