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“O CERTO É O FILHO ENTERRAR O PAI E A MÃE!”

Quando o pai perde o filho no voo 447 da Air France, em maio de 2009, que se dirigia a Paris e abruptamente mergulhou no Oceano Atlântico matando 228 passageiros a bordo, sendo que 74 corpos permaneceram definitivamente no fundo do mar. Segundo os especialistas, uma morte sem dor, como se a pessoa estivesse em sono profundo e, de repente, acometida por uma parada cardíaca fulminante.
Inconformado, o pai se revolta contra Deus: “O certo é o filho enterrar o pai e a mãe, e não o contrário!” – frase incansavelmente repetida por quase todos que vêm ao mundo, e pelos que ainda virão.
No último contato que o pai teve com o filho, ele o abraçou de tal forma que soou como uma premonição. Ele nunca se despedia assim de ninguém. Rezou para aquele sentimento ruim ir embora. Reclamou do filho ir para tão longe trabalhar com prospecção de petróleo. Era assim que ganhava o dinheiro dele, foi sua resposta. Se estivesse a seu alcance, o pai o teria impedido de embarcar. Foi o último a entrar no avião.
No dia seguinte, o avião sumira, deixando o pai perdido, desesperado, com a sensação de que tamanha desgraça iria se arrastar para o resto de sua vida. Seus pais e irmãos já tinham partido, mas filho é como se faltasse um dedo na mão, ainda mais que teve uma prole de cinco:
Você pega aquele garotinho no colo, dá banho, penteia o cabelo, troca a fralda, leva ao parquinho, à escola… e, de uma hora para outra, acaba? Não é justo!
Quando o pai começou a se lembrar que o filho nadava muito bem e que podia se encontrar numa ilha no Oceano Atlântico, são e salvo, temeram pela sua sanidade mental. Agonia que o torturou até os restos mortais de seu filho chegarem às suas mãos, comprimidos e lacrados numa caixeta. Embora não fosse o corpo guardado num caixão, mais apropriado a um sepultamento em que você precisa ver o ente querido para dele se aproximar, se despedir e se conformar com o fato de ele já estar em outro mundo e que fisicamente não mais retornará.
Caso contrário, pode se manter na vã esperança de que nada disso aconteceu e que um dia ele irá voltar. Como somos escravizados à materialidade dos fatos, não conseguimos nos desprender do que nos une e vincula à Terra e passar a enxergar o Outro Mundo, cujos padrões dispensam o uso da linguagem para nos entendermos e nos valermos do pensamento para nos comunicarmos. Precisamos de um corpo para ter que alimentá-lo e enterrá-lo ou cremá-lo no encerramento de sua vida útil. E chorarmos nossas mágoas quando os entes queridos se vão em busca de outros caminhos.
E assim também nos encerramos e nos restringimos, acentuado pela descrença motivada pela falta de senso da justiça que julgamos reinar sobre nossas cabeças e que subitamente retira nossos filhos das famílias que formamos, sem que nos seja dado satisfação, e ninguém ser responsabilizado por tragédias que dizimam a nossa precária felicidade.
Somente se socorrendo do espiritismo para aceitar o desaparecimento de um filho, antecipando-se a seu pai e a sua mãe, por não termos acesso aos papéis que desempenhamos em vidas passadas, de onde, provavelmente, trouxemos desgosto, mágoas e contrariedades diversas aos que nos cercavam e nos queriam bem, consubstanciando carmas a serem purgados em encarnações futuras. Se a medida é excessiva, em tom de tragédia, não nos encontramos à altura para julgar, até por faltar elementos.

Antonio Carlos Gaio:
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