A mulher precisa de um projeto para sua existência. Não pode se restringir ao homem como centro de sua gravidade, prisioneira de um destino. Ouviram? Não! Quando abrem a boca, só reclamam que falta homem, sem a mais leve menção à qualidade. Se perdem a beleza e o encanto, então, que lástima! Ninguém mais lhe passa uma cantada, a assedia com um “gostosa”, sequer a encara na rua, quando não se dirige a ela com um insultante “senhora”! O pior de envelhecer é virar espírito antes do tempo. Tornar-se invisível ao olhar do homem é a prova de seu fracasso como mulher.
À medida que vai envelhecendo, fica paralisada na nostalgia corpórea do passado e em sonhos juvenis. Por que a nossa cultura valoriza um comportamento e subjetividade tão infantilizada, semelhante ao do filho que depende do olhar do pai ou da mãe, sustentando-o psiquicamente, e que se arrasta pela vida afora? O comando robotizante é o de ser sexy a todo custo, com corpo e postura jovens até morrer. É o predomínio da imagem, das novelas, das celebridades, o que importa é a visibilidade.
No extremo oposto: a maturidade. Sinônimo de seriedade estressante, sintoma de que a velhice chegou em papel celofane: comunico-lhe que você está ultrapassada! Uma mulher que vai direto ao assunto e diz o que pensa, é considerada agressiva. Perdeu as boas maneiras e o fino trato, o senso de feminilidade não mais a acompanha.
Se a mulher mirar-se no espelho face a face com suas dificuldades, questões, falhas, indecisões, enfim, tudo que ela reúne em seu complexo de Eva, é possível ela se emancipar emocionalmente? Conquistar autonomia dá trabalho. Se deixar ficar numa situação resguardada e confortável, evita de se preocupar com o ir à luta; por exemplo, malhando no ferro o homem que não gosta de discutir relação. Quando ele prefere ver a mulher, examinando-a, do que ouvi-la. Mas se elas permitem que eles cresçam desvalorizando as próprias mulheres, há que descobrir o fio da meada de tamanha falta de admiração de um pelo outro.
Antigamente, as mulheres eram menininhas inocentes que não sabiam de nada, casando-se com homens que lhes ensinavam de tudo: os donos da palavra e das decisões. Cabia apenas à mulher resolver no que concernia à maternidade e se realizar na gestão da prole. Atualmente, ela não quer mais ficar mendigando a atenção dos filhos ou do marido que abandonou a família. Não quer mais se deter na posição de se ver sozinha e precisando desse carinho e olhar compreensivo, quando todos se forem.
Hoje, as mulheres, quando traem seus maridos, jamais confessam que foi por causa do seu desejo. Seria dispor o corpo segundo sua vontade e libertá-la da culpa, sob o risco de pesadas suspeitas de terem se perdido em busca de um amor mais genuíno. Preferem culpar os homens pela traição, por faltarem com atenção e carinho e não mais as desejarem. O discurso é sempre o de vítima. Eles, em caráter totalmente oposto, vazam pelo ladrão que têm suas necessidades e não negam seus desejos, mesmo afirmando que continuam a amar suas esposas. Contradição que as irrita, pois se sentem ludibriadas pelo eterno discurso dos homens baseado nos seus padrões biológicos que, desde os ancestrais, obedecem a outras exigências de realização.
A constatação de que os desejos do homem e da mulher não caminham juntos em direção ao mesmo sol. Cada um se dirige para o seu lado. Não há a menor possibilidade de os desejos se sintonizarem numa relação estável – só se ambos se consumirem autofagicamente. Ele deseja sem maiores culpas, o que lhe confere alegria de viver. Na medida em que a mulher faz essa enlaçadura e aprisiona o desejo, ela reproduz o padrão que ainda se encontra no seu DNA. O da vitimização, em que a família a protege e as amigas a cercam em solidariedade, quando não exaltada como heroína por lutar sozinha pela preservação do relacionamento. Se o homem aceitar esse padrão, lhe será embaraçoso; assumindo o papel de vítima de uma mulher, será considerado menos homem.
Se a mulher continuar acreditando que é vítima do desejo ou não-desejo do homem, ficará à mercê da rejeição por estar sempre subordinada ao desejo do outro, e não ligada no próprio. Onde está a saída desse labirinto? Só amar a quem amá-la em triplo? Partilhar seu destino com generosas criaturas que a amam muito além de suas limitações traria segurança. Todavia, se somos amados e desejados, mas não correspondemos à altura, é porque nos tornamos passivos no que concerne ao amor do outro, quando amar é alternar em ser ativo e passivo numa relação. É não se acomodar com a garantia de que não será abandonado e se fazer presente no beijo na boca ao alvorecer, assim que despertar.
O homem corre infindáveis riscos ao assumir mais seus desejos; as mulheres, muitas vezes, nem sabem bem quais são seus próprios desejos. É uma libertação descobrir que não tem mais nada a provar a ninguém, nem se preocupar com o que vão pensar do destino que deu ao seu desejo.