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O HOMEM QUE SE ESCONDE ATRÁS DE SUA PRÓPRIA FACE
O homem que se esconde atrás de sua própria face para não revelar seu fracasso.
Há algumas coisas que, quanto mais ele vive, menos se conhece; mais pensa a respeito e mais obscuras ficam. Quanto mais ele pensa, mais sabe que nada sabe. E mais sua mente se enrola, se emaranha, se complica, atrapalhando-o de tal forma que não mais podemos entender o que dele resultará, a despeito de sua inteligência privilegiada nos impressionar e imaginarmos que ele tem solução.
Então, por que ele persiste no desânimo? Só por se sentir pequenino diante de um mundo adulto que, de tão grande, não possa compreender? Para quem gosta de jogar com as palavras, é o caso dele se cuidar para não se revelar. Uma boa dose de cinismo ajuda. Senão revelará que não tem projeto para a vida.
É o homem que se esconde à frente de não se conhecer a si próprio como meio de lidar com a vida. Não tem o menor interesse em se desnudar – considera falta de maturidade. Prefere guardar tudo para si. Vibra quando não conseguem devassar sua estranha personalidade e inferniza os psicanalistas de plantão, sem perceber a tristeza que injeta no ânimo dos que o cercam, levando-os a se afastarem desiludidos – torturados pela dor da perda do coração amigo. Movido pelo ceticismo, não permite que alguém adentre sua alma e descubra os segredos que revelam o que mais teme. Só porque receia compararem sua vida ao voo da galinha, que sai do nada e não vai a lugar nenhum.
Como os torturadores que deixaram o rabo à mostra quando não mataram a todos que participaram da luta armada contra o regime. Se era para fazer trabalho sujo, que se sujasse todo. Se era para hoje viver escondido, à sombra de uma longa e tortuosa noite escura sem fim, de que adiantou torturar em nome de uma causa que se perdeu no tempo? Inútil a trajetória dos homens que se escondem atrás da própria face, a ponto de se confundirem com os torturadores à medida que se interrogam em silêncio: de que adiantou humilhar e triturar a quem tinha tamanho ideal?
Humilhados restam os descrentes e céticos que ficaram sem ideias enquanto gozavam a cara de quem tinha ideais e acreditava em tudo de boa-fé. De mudar o mundo. Botar o pé na estrada como um easy rider. Fazer apologia dos sonhos. Não ver malícia em nada. Não desconfiar. Não ser do contra. Balançar a roseira e livrar as rosas dos espinhos. Amar acima de todas as coisas. Ter fé no caminho que escolher. Seguir seu credo de forma independente.
O homem que se esconde atrás de sua própria face prefere assim o fazer para não revelar o seu próprio fracasso. Apegado à materialidade das coisas e regulando sua falta de perspectivas. Como pensar em vender sua alma se nem na sua própria alma acredita? O espírito desfibrado, contudo, adultera seu caráter e o torna uma fraude. Se bem nascido aqui encarnado, tratou de deteriorar faculdades raras com que tantos sonham e lançá-las ao vento. E aguardar burocraticamente a grande viagem.
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Antonio
Carlos Gaio
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