O pior cego é quem não quer ver que é muito amada só porque exige um perfeito encaixe nos papéis tradicionais, uma fidelidade a toda prova e o respeito formal a todos os disparates ouvidos durante a convivência. Só porque não definida a escolha de Sofia ou arrancada a certeza de que não será abandonada. Só por não admitir que o idioma falado no amor dê margem a filosofias inconsequentes – filosofia de botequim ou alta filosofia é tudo a mesma titica. É não abrir mão do pão, pão, queijo, queijo, da tábula rasa, de não permitir sair pela tangente. Culminando por matar a paixão. Quando dualidade, bipolaridade e ambiguidade fazem parte da nossa anima e integram o contexto da vida, o que não quer dizer que sirvam de álibi em defesa da infidelidade. Contudo, a negação de sermos bivalentes (verdadeiros ou falsos) e bissexuais (nossa sexualidade não é cem por cento definida) implica em contrário senso num exclusivismo que descamba para a possessividade e o ciúme doentio. O cotejo dessas forças profundamente antagônicas nos obriga a procurar o equilíbrio para evitar que essa verdadeira briga de foice entre o bem e o mal acabe por nos internar no hospício.