Oração feita pelo alemão Hans Staden a Deus Nosso Senhor quando esteve durante 9 meses, em cativeiro, na costa entre Rio de Janeiro e São Paulo, por volta de 1554, à mercê dos índios tupinambás, que comiam carne humana e planejavam devorá-lo dentro do ritual antropofágico que caracterizava sua cultura.
“Ó, Todo-Poderoso, que criaste a Terra e o Céu, a ti peço, Senhor eterno, salva-me das mãos desses homens cruéis que não te conhecem, segundo a vontade de teu filho Jesus Cristo, que salvou os condenados da prisão eterna. Contudo, meu Senhor, se for tua vontade, que eu sofra uma morte tão violenta, executada por esses homens que não te conhecem e dizem, quando falo de ti, que não tens o poder de me libertar das suas mãos, então fortalece-me na minha última hora, para que eu não duvide da tua misericórdia. Mas se devo sofrer tanto nesta vida desgraçada, então dá-me em seguida a paz e protege-me da desgraça no outro mundo, diante da qual todos os nossos antepassados se horrorizaram. Todavia, meu Senhor, certamente podes me libertar da violência dos selvagens. Ajuda-me, pois sei que podes me ajudar. E se me ajudares, não quero contar com nenhum acaso, mas somente com tua mão poderosa. Pois aqui nenhum poder humano é capaz de me ajudar. Quando me tiveres libertado da violência deles, quero louvar teu benefício, trazendo-o ao conhecimento de todos os povos em meio aos quais eu venha a me encontrar. Amém.”
À salvação rogada a Deus, pede para que fortaleça seu espírito no caso de um fim tão violento, de modo a não duvidar de sua misericórdia. Mas se a vida é tão desgraçada para caber que se vá uma existência sendo devorada por humanos à sua semelhança, então só resta pedir paz espiritual e proteção contra a desgraça no outro mundo (Plano Espiritual) – que o digam os nossos ancestrais! Ressalta que somente a mão poderosa de Deus para libertá-lo do cativeiro e da extrema crueldade em alimentarem sua angústia e desespero, pois nenhum poder humano seria capaz. Prometeu trazer ao conhecimento de todos os povos com os quais viesse a se encontrar toda a sua desdita e sofrimento sob a guarda e a serviço de canibais logo que conquistasse sua liberdade, mas antes louvaria a graça que Deus lhe concedeu de viver por mais tempo.
Deus lhe retribuiu com mais, muito mais. De volta à Europa, Hans Staden redigiu um relato sobre suas viagens e aventuras no Novo Mundo, uma das primeiras narrativas para o grande público acerca dos costumes dos indígenas da terra do pau-brasil, e que se tornou um grande sucesso na época. Sucesso até hoje como bibliografia obrigatória, seja em nível escolar ou como matéria de estudo para ciências humanas.
Hans Staden, em espírito, viria a compreender o sacrifício que lhe foi imposto. Para não desistir nunca. Uma missão para agregar maior sapiência ao mundo lhe foi reservada. Sobre outros seres ainda desconhecidos no planeta, cuja cultura antropófaga e primitiva acabou sendo banida, mas, por outro lado, outros valores da cultura indígena afloraram, como cuidar bem da Natureza e com ela aprender. Buscar um melhor equilíbrio entre o homem e o seu meio natural. A defesa da preservação do meio ambiente e o índio, o nativo, o autóctone como seu símbolo maior. E assim Deus vai lapidando o mundo, extinguindo o que já venceu seu prazo de validade e tirando do mesmo embornal o novo desenho da realidade se utilizando de nós, à sua imagem e semelhança, para construir pedra por pedra.