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PAU-DE-ARARA

A tortura no Brasil evoluiu muito, desde o tapa-ouvidos aplicado no matuto até o pau-de-arara sofrido por quem ousasse encarar os óculos escuros do ditador. Consiste na passagem de um pedaço de pau debaixo dos joelhos do preso, que fica suspenso de cabeça para baixo. Segundo Cid Benjamim, a criação se originou em um nordestino retirante num caminhão sem espaço para se acomodar e que se tornou policial, adaptando a experiência para interrogatório. É a única situação em que o sangue sobe à cabeça e você não pode reagir. Acrescente-se golpes, afogamentos e choques elétricos enquanto pendurado. E ai de quem não acreditasse que a corrupção teria o mesmo fim da saúva no Brasil.
O empresário Jorge Yunes rechaça a pecha de comunista e se declara cristão, ao não ter apego a dinheiro e dar empréstimos a amigos, ou melhor, a Deus. Reconheceu de público que a estabilização da moeda promovida por FHC aviltou e desmoralizou os salários dos políticos, obrigando a ele a emprestar para o ex-funcionário de Maluf a quantia de R$800 mil em pingadas parcelas. Em dinheiro vivo, já que abomina cheque ou cartão de crédito. Desafiado sobre a quantia que costuma levar no bolso, não titubeou e jogou na mesa maços e maços de notas de R$50. Cutucando com vara curta seqüestradores, ladrões e a banda podre.
Mundo neoliberal inseguro que torna atraente inversões maciças em cemitérios, como o de São João Batista, cuja expansão, em direção ao subsolo, se encontra na prancheta do arquiteto. O que vem tirando o sono de moradores de Botafogo, pois implicará na desvalorização de suas moradias. Positivamente, o Primeiro Mundo lida melhor com a morte, haja visto a Recoleta, com seus restaurantes, bares e museus, dividindo o espaço numa boa com Evita Perón, hospedada no cemitério ao lado – justo motivo de orgulho para os argentinos. Bem como o Père Lachaise, em Paris, cujas tumbas de Balzac e Molière se transformaram em ponto de visitação turística.
Custou, mas esgotou-se a paciência do povo. Cansados da democracia que impera no país, no qual fazer manifestação para defender pontos de vista não encontra eco, estudantes, sindicalistas e servidores públicos partiram para a bordoada. Quebraram um ovo no Serra e acertaram o quengo de Covas, que plagiou Zagallo: “vocês vão ter que me engolir, seus panacas e fascistóides, nunca souberam o que é democracia!” E pegaram pesado com Ciro Gomes, ao atingir a candidatura de sua ex-mulher à prefeitura de Fortaleza, com o adesivo: “Patrícia Gomes: nem Ciro agüenta”.
Sai pra lá, Satanás, desconjuro! Oremos na missa dominical das onze na Igreja Nossa Senhora da Paz, em Ipanema. Em corrente com uma senhora baixota, rechonchuda, de óculos escuros e braços tatuados com panteras e medusas, que reza fervorosamente em agradecimento, depois de um longo período de reclusão, por ter se livrado da dependência química e voltado à ativa como produtora artística. Abre o verbo para alardear sua fase careta, a vovó pop. Já vão longe os tempos em que a ex-sacerdotisa do Movimento Anarquista Tropicalista Energético (MATE) se casou no edifício-garagem Menezes Cortes para delírio dos adversários políticos de seu pai. Parece mintchura. Mas não é, passou o cetro para Narcisa Tamborindeguy depois que Liz Taylor finalmente desistiu de procurar outro Richard Burton: “Eu, casar-me outra vez? Não sou tão estúpida!”

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Antonio Carlos Gaio
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