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PELÉ FOI ALÉM DO SEU TEMPO

Eu e Pelé 1966

Pelé não morreu, pois vai estar sempre presente em nossa memória, como um espírito que não para de crescer, mesmo depois de desencarnado, agora que descobriram que ele tirou o duro esporte bretão das garras do troglodita para o futebol-arte, ao abrir as portas em todo o planeta para consumi-lo e praticá-lo em todas as instâncias de sua beleza e plasticidade, haja vista a última Copa do Mundo na decisão entre Argentina e França. Mais estádios levarão seu nome, sua bondade, solicitude, fino trato, amor e respeito ao próximo que servirão de paradigma para os que virão depois, ainda mais sendo negro e de origem humilde. A façanha de Pelé (com 17 anos) ter conquistado a Copa do Mundo de 1958 (ao lado de Garrincha, Didi, Nilton Santos e outros) e o gol de placa no Fluminense (com a bola em seu poder de uma área à outra) me fizeram crer que nunca mais veria um craque igual a Pelé (nem tampouco Garrincha) e jurar que não mais deixaria de assistir a um jogo sequer do Pelé no Maracanã, seja do Santos ou da Seleção Brasileira (de São Paulo, acompanhava pela TV). E assim foi feito, era uma fase de ouro de nosso futebol, os anos 1960, os mais felizes de minha vida, desde que arquivados aqueles acontecimentos que costumam forjar nossa existência. Fui um dos súditos do Rei mesmo tendo ele infligido derrotas ao meu Vasco, um reconhecimento à sua soberania sem o menor grau de fanatismo. Perdi uma referência que sempre esteve presente ao mirar o horizonte. Sou grato ao Pelé por ser seu contemporâneo e me influenciar tanto, apesar de eu não ter perseguido a carreira de jogador profissional como deveria. Impressionavam sua noção de equilíbrio, alternância de movimentos e facilidade em driblar, sendo objetivo e sem vontade de aparecer, apenas fixado obsessivamente no gol, a razão de ser no futebol. Não há como se conformar, Pelé não está mais entre nós. O mergulho profundo na tristeza é inevitável por tudo o que nos proporcionou em matéria de espetáculo, grandiosidade, surpresa e credibilidade.

Antonio Carlos Gaio:
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