No afã de investigar corrupção, tramoias, pareceres exarados contra o interesse público, tráfico de influência, nomeações casadas para conquistar cargos que lidam com milhões, garantias falsas, avalistas sem crédito, contas bancárias fictícias, patrimônio forjado, palestras não levadas a efeito e o considerado economicamente viável e que atenta contra a natureza, adentra-se no território da internet com autorização do juiz para seguir as pegadas do suposto crime e invade-se inevitavelmente a privacidade. Sobretudo em e-mails, facebook, comentários e fotos. Onde as vidas profissional e privada estão incomensuravelmente mescladas.
Mensagens extremamente pessoais ficam guardadas por anos em servidores, passíveis de serem descobertas por investigadores em busca do delito e acabando por se defrontar com adultérios, cuja aparente pouca relevância sinaliza no mínimo um facilitador para operar o tráfico de influência. Para se constatar que a velha moral perdeu espaço para a tecnologia ou então, que sempre foi assim e a gente não sabia quanto.
Rasgam-se trajetórias impolutas, expõem posturas abjetas, num linguajar de marginal, é a nossa realidade. Que, ampliada no foco, custa a crer que estamos aí dentro dessa caixa-preta a poder fazer coisas que duvidávamos há tempos atrás. Ou se não tínhamos dúvidas, era garantido manter segredo sobre nossas idiossincrasias. Afinal de contas, até precisávamos fazer psicanálise para identificá-las como sendo nossas.
Agora, não. Estão disponíveis ao alcance de espiões que poderão nos chantagear. No caso de não termos feito nada de errado, fica a sensação de inquietude de podermos ser devassados e mapearem nossas fraquezas, desequilíbrios e obsessões, bem como por quais fascínios iremos vender nossa alma. Isso se não for perversão, perseguição aos mais fracos ou maledicências que consideramos em níveis perdoáveis num esforço autoindulgente.
O panorama muda se nos expusemos à expiação pública, na qual se julga conforme os padrões que exigimos para a coletividade, por nunca pressupormos estar um dia no lugar de réu. De antemão, temos certeza de que o julgamento será rigoroso. Sujeito a charges e comentários maliciosos e desmoralizantes que vão para as redes sociais, de modo a nos apedrejarem. Se a pedra alcançar suas escolhas afetivas, mesmo que seja uma mentira deslavada, o que é falso passa a ser verdadeiro, pois você está na obrigação de se defender.
Aí constatará como é fácil atacar e agredir seus adversários, e penoso se defender. Ainda mais se cair na rede. A quem se dirigirá? Se sua intimidade virou um alvo perfeito? Por justamente não saber lidar com você mesmo e com o que fala. Com quem ama. E o amor e a traição fazerem parte do quanto vulgarizou sua existência.