O que leva um senador a se envolver em acusações de escutas telefônicas clandestinas que municiam sua indústria de dossiês de cuja fama até Maluf foi vítima? No mesmo ano em que renunciou ao mandato para escapar do julgamento de violação do painel eletrônico do Congresso, incorrendo no pior atentado contra o regime democrático: a fraude na votação. Um mito na Bahia que conseguiu galgar, em 50 anos, quase todos os postos possíveis na política, exceto a Presidência da República. A disputar com José Sarney a auréola do maior nome das forças conservadoras do século XX, oscilando entre autoritarismo, liberalismo e oligarquia, a síntese da manutenção do status quo político-social.
Mas que continuam a embaralhar as cartas e se encher de curingas, quando o plenário rejeitou o processo de cassação de ACM ao tornar secreta a votação no affaire dos grampos. Liberando consciências a serviço de conquistar fatias do Poder para negociar o que é do interesse público ou de segmentos da classe dominante que procuram se perpetuar em dinastias, cujo inimigo maior é o Destino. O mesmo Deus do Senhor do Bonfim e de São José de Ribamar, que a tudo vê e interfere, ora afaga com a mão direita, ora o abandona com a mão esquerda.
Valer-se de ordens judiciais para grampear telefones de traficantes, inserindo 232 desafetos, à sorrelfa, debaixo das ventas do Judiciário e do aparato policial da Bahia, achando que nada vai acontecer porque Deus é brasileiro, deixa o eleitorado em maus lençóis tentando decifrar o enigma do tirocínio de caciques políticos.
Ora se sentem humilhados e desprestigiados, ao assistirem o destino de seus filhos, Roseana e Luís Eduardo, brutalmente cortados a caminho do trono presidencial. Ora reagem, como personagens de Jorge Amado, para reparar uma flagrante injustiça do Destino ao não coroar percursos brilhantes, posto que homens de sua estirpe se reelegem com um pé nas costas e exigem respeito em nome da história do Brasil que escreveram.
O PT não se pinta mais para a guerra, seus tambores ressoam para o seu umbigo, e multifaceta a moral vigente no poder. A senadora Heloísa Helena defende a flexibilidade da lei para o fraco, firme para o forte e implacável para o contumaz. Já o guerreiro zen Gushiken, com os testículos e estômago extraídos para conter a metástase do câncer, interpreta o discurso político: “não há pureza de intenções, o autor oculta para não falar o que pretende; é preciso dizer sempre a verdade, mas na hora certa”.