Quando hoje eu a vejo cruzar comigo toda semana, depois de anos de juventude lentamente exauridos que parecem séculos, ela segue ainda não se apercebendo que eu me embeveço com sua beleza entranhada em seu espírito que não deixa passar luz e ver nitidamente o que existe através. Se ela permitisse me aproximar, se surpreenderia com meu fiel fascínio de longa data. Permanece com o mesmo corpo de garota de Ipanema, tão intacto que me permite fantasiar como tudo seria diferente se ela tivesse sido minha namorada, bem que hoje poderia ser, se ela quisesse ser somente minha, amada para valer, sem o que a vida não vale nada e se quer morrer. Talvez o meu caminho não convenha para ela no infinito de nós dois e não possa dizer que eu te amo por toda a minha vida. Talvez ela não inspire amor, somente fantasia, que perpassa o tempo, implacável, sem se deter. Talvez um dia ela desapareça, tal como surgiu, apenas remanescendo num espaço recôndito de minha memória. Por que, então, me causou tamanho impacto como um bólide celeste que veio de encontro à minha superfície nos meus piores momentos de platitude? Se, a rigor, ela nunca sairá de sua rota, não abandonará sua órbita, porquanto atraída por um astro maior não visível a olho nu. Melhor não observá-la mais, escorrendo por entre os dedos pela segunda vez, para não mais sofrer. Ainda mais que ela de nada sabe por lembrar uma secular estátua, que vence a erosão do tempo, apenas descolorindo e com seu corpo fendido em lascas.