Se é verdade que a cada dia basta a nossa cruz, por que então insistimos em carregar para o dia seguinte nossas mágoas e dores? Há ainda os que levam para a semana seguinte, o mês que vem e anos afora, cuja acumulação forma o lixo existencial a que nos apegamos, tal como essas coisinhas inúteis que guardamos em nossas gavetas, mas sem coragem para jogar fora.
Mas que deixam marcas e cicatrizes para nos lembrar do que fomos, do que fizemos e do que devemos evitar, levando-nos a sonhar com uma cirurgia transformadora da alma que nos restituísse o coração renovado, extirpado de todas as nossas vivências que resultaram em desastre e malogro.
Graças a Deus, isso não é possível! Não devemos nos esquecer de nosso passado. Onde erramos, teimamos em nossos pontos de vista, nos enganando quanto a escolhas ou caminhos pelos quais optamos. Não podemos nos esquecer de nossos embates, lutas sem trégua, vitórias que nada representaram e quedas sem fim. Muito menos dos seres humanos com quem nos iludimos e nos decepcionamos, esses que nos direcionaram para o sofrimento, muitas vezes sem o saber, sobrevindo o gosto amargo do sentimento de derrota e o ódio estampado no rosto.
Dando-nos a chance de perdoar a quem nos feriu e a surpreendê-lo, até mesmo incomodá-lo, por ele julgar que o ódio permaneceria imutável, baseado em mágoas envelhecidas moldando nossa existência, habitualmente transparecidas na fisionomia do ser humano. Incrédulo com o ato corajoso e ousado de abrir a gaveta do nosso coração e dizer: “eu não preciso mais desse ressentimento, não me traz nenhum benefício e eu posso perfeitamente viver sem”.
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