Muito por causa do título do filme que estreou, “Todo mundo tem problemas sexuais”, o ator Pedro Cardoso foi lembrado pela polêmica que levantou há 3 anos ao combater a nudez desenfreada no cenário audiovisual brasileiro e reafirmar sua aversão ao nu como condição de inserção no mercado. O mercado não chama isso de pornografia porque seria moralmente ofensivo, tratando de disfarçar como um comportamento natural. Como se natural fosse os personagens tomarem banho a toda hora, quando é um subterfúgio para mostrar mulher pelada, pois em nada acrescenta para a trama da novela. A partir de um capitalismo selvagem estruturado para explorar a produção de bens culturais e com o fim das cruzadas moralistas na Era de Aquário, a indústria de entretenimento se apoderou do nu para subjugar e oprimir o ator, recorrendo ao apelo básico e primitivo de que, se passar alguém pelado diante de nós, não conseguiremos deixar de olhar. Quando a cultura é o lugar da razão; o teatro, a arte de representar; e a narrativa de uma história são conversas da razão, significando que, se o ator ficar nu, o personagem desaparece – a nudez reduz o ator à sua pessoa. Pedro Cardoso, que encarna magistralmente o Agostinho Carrara, personagem engraçadíssimo da “Grande Família” na TV Globo, despreza a importância de mostrar-se despido em cena para contrastar quem somos nós vestidos dos que estão nus com a mão no bolso. Até para apreciar a beleza e o tipo de corpo. O formato dos órgãos sexuais. O todo nos mínimos detalhes. O ser visto pela retaguarda. Que seja como um refresco na sequência dramática. Ou o mote para pintar, esculpir e escrever a respeito. A nudez imortalizada em fotos cinematográficas. O discurso contra o nu, mesmo aviltado pelas leis do mercado, reaviva os fantasmas da repressão, do falso moralismo e da TFP – “pois assim é se lhe parece” -, dos quais a década de 60 foi se encarregando de sepultá-los em plena ditadura militar com movimentos de “Paz e Amor”, a peça “Hair”, os “Dzi Croquettes” e o teatro besteirol, do qual Cardoso foi um dos pilares. Pode ser que, um dia, rejubilar-se com a nudez e sentir tesão em apreciá-la seja considerado um ato pré-histórico e a razão prevaleça na arte ou fora da arte. Todavia, ainda estamos atrelados à cultura do corpo, sobretudo num mundo globalizado que ainda engatinha em termos de evolução. O apelo da sensualidade de determinadas linhas corporais ainda nos ensandece, seja a homens ou a mulheres, a gays ou lésbicas, tirando-nos do sério e, consequentemente, chamando ao pau – como diria Agostinho. Pedro Cardoso confessa que se incomoda com todos pensarem que ele é engraçado, quando apenas goza de uma boa percepção do ridículo e do que ele provoca em matéria de comicidade na vida. O típico caso do ator que fica na memória do público por conta de um personagem hilário e, fora do palco, não o aceita. Rejeita até. Pelo ridículo com que é confundido e exposto. Não gosta que misturem ficção com realidade. O Pedro Cardoso da vida real teria muito a aprender com Agostinho, se não se levasse tão a sério. Quando a composição do seu trabalho artístico gira em torno da comédia. Quase sempre.
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