Não é difícil encontrar uma alma humana que se ache possuidora de uma inteligência que paire acima das outras. Rara é aquela que jamais transpareça tamanha estultícia, fingindo-se simples, acessível, risonha e extremamente cordata e simpática. Mesmo porque, como ele iria tirar partido de uma sagacidade que não poderia comprovar? Não que não procurasse demonstrar sua vocação em bom nível, no capricho e de forma a despertar curiosidade. Mas não para colocá-lo nas alturas. Deixando-o frustrado e acabrunhado com suas perspectivas. Transformado em segredo que não confessava nem para si mesmo, solitário no banheiro, ensaboado da cabeça aos pés. A primeira providência que tomou foi parar de examinar à sua volta como os rivais contornavam as limitações. Com o decorrer do tempo, por falta de alternativa, passou a acreditar tanto nos seus pendores que, por absoluta ausência de senso crítico, descobriu ser maravilhoso – o talento está escondido nas coisas mais simples. Contou com a ajuda do círculo ao seu redor, que não se dispunha a ir mais longe e o aceitou tal como ele se vendia – para que retocar a farsa? Excelente oportunidade para a paranóia surgir. Alguém que pudesse desmascará-lo perante sua própria face. Apenas indagando por que preferiu o caminho mais fácil e cômodo, preterindo suas reais possibilidades. Desse tipo de gente ele quer distância. Ver-nos-emos assim que for possível. Excluindo o intruso de sua platéia, pequena, porém fiel. Só que tal atitude defensiva quebra o vínculo, envenena amizades e o adeus é inevitável. Por motivo fútil, de egos em conflito. Contudo, um dia, o assim que for possível realizar-se-á, sem mesóclises, num plano distante onde tudo é possível e poder-se-á falar do que é que eu te fiz de mal para me tratares assim.
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