“Você pagou com traição a quem sempre lhe deu a mão.” Foi com a música de Jorge Aragão que a Brizolândia enxotou Lula e sua comitiva do velório de Brizola. Ostentando adesivos com a inscrição “Brizola vive”, se amontoaram no salão e entoaram palavras de ordem que alternavam “Darcy, Brizola, criança na escola” com “Se Cuba tem Fidel, o Brasil tem Leonel”, munidos de pôsteres e bandeiras do PDT, cantando o Hino Nacional e o da Independência, pedindo a renúncia do presidente diante de tamanho desrespeito.
Uma grosseria que só se desculpa pelo sofrimento da perda, a militância do PDT é aguerrida, adora o Brizola, contemporiza Ciro Gomes. Ai, como seria bom herdar a massa trabalhista, se não fosse o fim da era de políticos carismáticos que tinham nas suas pegadas seguidores, e não apenas simpatizantes. Lastimam-se políticos eleitos, que agora realçam discordar de uma ou outra posição de Brizola, divergiam sem nunca deixar de respeitá-lo pela firmeza com que defendia seus pontos de vista e, no final das contas, as diferenças eram muito poucas quando somavam esforços nos interesses nacionais – morto não tem defeito.
Ao ser acusado de personalista e centralizador, depreciava-se Brizola por não deixar herdeiros, ao valer-se do canibalismo e nutrir-se da carne de aliados para fortalecer-se e enfiar sua lança nos inimigos do país. Falam de herança política, sem o menor pudor, como se o povo fosse gado. Perguntem ao FHC se Serra é o seu herdeiro legítimo. ACM apenas os deglute. Sarney, a filha. Jânio nos deixou órfãos. Pitta pertence a Maluf. Collor, filhote da ditadura. Herança de quem, cara pálida?
E para que herdeiros, se eles vêm do limbo e traem a quem lhes deu a mão? Agarrados à falácia de que divergir faz parte da democracia e é legítimo seguir o seu próprio caminho. Todas as crias de Brizola dominam o panorama político do Rio de Janeiro dos últimos doze anos. Cesar Maia foi prefeito duas vezes, além de ter criado o factóide Conde. Marcello Alencar governou o Estado com seus dois filhos, Garotinho o sucedeu e nos legou a Rosinha. Até o gato angorá foi pedir benção.
E para não dizer que não se falou do leite das crianças, e quanto aos herdeiros legítimos? Neuzinha se tornou uma “mintchura” e José Vicente, rompido com o pai há quatro anos, lamenta não ter tido tempo para uma reconciliação. Arrepende-se de ter trocado o PDT pelo PT por pensar que representaria forças progressistas. Magoa-se com o autoritarismo do pai em querer processá-lo, considerando-o como a fonte de uma reportagem que levantou suspeitas sobre o patrimônio do ex-governador. Reclama do pouco tempo dedicado à família. Agora terão que ir em périplo a São Borja, com filhos e netos, se consultarem com a pedra filosofal do mausoléu de Brizola, sempre que precisarem.
A paixão pela política. A ser paga com traição. Tudo cairá no esquecimento, inclusive se a história do Brasil teria sido outra com o trabalhismo chegando ao poder. Em 1989, por 0,4%.
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