Woody Allen não comporta meio-termo, ou você é apaixonado pelo universo que ele apresenta a cada filme ou se antipatiza, rejeitando-o até a quinta geração. Ou você se torna cativo de suas elucubrações freudianas ou despreza aquela lombriga com ar de retardado gaguejando coisas inteligentes. Os que babam seus ovos são os mais elitistas: “quem não gosta de Woody Allen é burro”.
Afinal de contas, Woody Allen é louco, neurótico, psicótico, hipocondríaco ou gênio? Maluco beleza nem pensar, teria uma embolia com as drogas. Onde é que ele arrumava tempo para enfiar tanta cultura naquele cérebro ocupado pela supermãe, só perguntando à Mia Farrow quando ela adotava uma penca de filhos durante o relacionamento aberto com o judeu vivo mais inteligente do planeta – honraria ainda não lhe conferida.
Mas como? Se Mia Farrow o enquadrou como um pedófilo por ter se separado dela para casar com sua filha adotiva, a coreana Soon-Yi Previn. Desconsiderando sua evolução desde “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa” ao ganhar o Oscar. Mas se no currículo de Mia consta: filha de Maureen O’Sullivan, a Jane do Tarzan; ex do já velhusco Sinatra; nos remeteu ao hospício em “O Bebê de Rosemary”; acumulou catorze filhos, sendo nove adotados; em sã consciência, escolha quem é o pinel.
Que confusão dos diabos, não se pode misturar ficção com realidade. Isso é esquizofrenia pura. Mas como? Se em “A Rosa Púrpura do Cairo” o ator sai da tela e convida a fã – Mia Farrow – a se incorporar ao universo do filme que via repetidas vezes, deixando o mundo real e entrando no da fantasia. Se Woody Allen em “Zelig” não consegue ser ele mesmo, pois tinha o dom de se assemelhar física e mentalmente a quem estivesse em sua companhia. Se ele se juntou a “Trapaceiros”, dando “Tiros na Broadway” em sua querida “Manhattan” e dizendo “Poucas e Boas” a “Celebridades” sobre seus “Crimes e Pecados”, por que não revelar “Memórias” de seus “Interiores”? Humilha a indústria cinematográfica em “Dirigindo no Escuro” quando fica cego, dirige um filme e ninguém percebe – em terra de cego, quem tem um olho é rei.
O conjunto da obra de Woody Allen começa a incomodar até seus mais fiéis admiradores, insistindo no “já deu tudo que tinha que dar”, torcendo o nariz para as sessões de psicanálise, não agüentando ir para o divã nos filmes, com um humor devastador que não perdoa a nossa pobre condição humana. Não aceitam mais ser prisioneiros de sua arte. Brinca demais com o alter ego que pode ser ele, nós, tu e eles, o judeu ortodoxo ou o babaca que não gostamos de ver retratado. Tripudia em excesso sobre a inaptidão para o sexo, seja no tocante à freqüência, manejo ou incompatibilidade, enfim, tudo que você sempre quis saber sobre sexo, mas tinha medo de perguntar. Acusam-no de verborrágico ao despejar seu humor corrosivo sobre a sociedade americana, pouco se importando com chefões que não o consideram mais lucrativo. Especialistas em decretar o ostracismo de estrelas que não conseguem mais digerir, tachando-o de chato e ultrapassado.
Woody Allen se encaminha para virar um parque temático de seus filmes.
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